terça-feira, 16 de novembro de 2021

O preguiçoso (Conto popular brasileiro), de Sílvio Romero

 

O PREGUIÇOSO
 

Havia um homem muito preguiçoso que nada fazia. Um dia veio um velho e pediu-lhe rancho em casa; o velho cansou-se de lhe bater na porta e nada do homem se animar a levantar-se para abrir a porta. Afinal desenganado, o velho pediu à dona da casa que lhe guardasse ali uma toalha que levava, mas que a não abrisse. O velho seguiu seu caminho. Mulher guardou a toalha, mas teve curiosidade e abriu-a. Apareceu logo uma grande mesa com tudo quanto é de bom e melhor de que a mulher se regalou. Ela escondeu a toalha, e, quando o velho veio procurar a toalha, a mulher deu-lhe outra em vez da sua. Chegando o velho em sua casa, mandou a toalha se estender e a toalha quieta. O velho calou-se e no outro dia foi à casa do preguiçoso e deixou lá ficar uma cabra pedindo-lhe que a guardassem até a sua volta, mas que tivessem o cuidado de não lhe dizer:

 — Berra, cabra!

O velho retirou-se. A mulher foi e disse:

 — Ora, isto é mistério; aqui temos novidade! Berra, cabra!

Entrou a cabra a berrar e começou a cair muito dinheiro de ouro e prata da boca da cabra. Logo que a mulher viu isto, trocou a cabra por outra, e quando o velho veio saiu enganado. Chegando em casa mandou a cabra berrar, e nada, e nada! Conheceu que estava enganado e calou-se. Chegou por fim um trabalhador do velho e lhe pediu ao amo o seu jornal. Respondeu o velho:

 — Meu filho, eu não tenho mais dinheiro; mas dou-te um cacete, que aqui tenho, que te há de fazer feliz.

O rapaz recebeu o cacete e seguiu. Foi ter justamente na casa do preguiçoso; pediu rancho e deu o cacete para guardar. A mulher trocou o cacete por outro, e no dia seguinte o moço disse:

 — Dê-me o meu cacete, que me quero ir.

O cacete entrou a dar bordoadas de criar bichos no marido e na mulher. Puseram-se eles a gritar, e o rapaz ficou admirado de ver aquela virtude do cacete.

A mulher aflita gritou:

 — Meu senhor, mande seu cacete parar, que eu lhe dou o que me deu o velho para guardar.

O moço disse:

 — Para, cacete, e tudo pra cá!

O cacete parou, e a mulher entregou ao rapaz a toalha e a cabra. O moço tudo recebeu e voltou para casa do seu amo, e lhe contou o que se tinha dado com ele na casa do preguiçoso. O velho então lhe disse:

 — Esta toalha e esta cabra têm virtude; quando tiveres fome, estende esta toalha, e te há de aparecer comida da melhor; e esta cabra quando berra bota dinheiro pela boca.

O rapaz ganhou o mundo com seus três presentes.


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Ano de publicação: 1883
Origem: Pernambuco (Brasil)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)

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