domingo, 5 de dezembro de 2021

O cavalinho das sete cores (Conto popular português), de Teófilo Braga

 

O CAVALINHO DAS SETE CORES
 

Um conde tinha ficado cativo na guerra dos mouros. Levaram-no ao rei para que fizesse dele o que quisesse. Tinha o rei três filhas, todas três muito formosas, que pediram ao pai que o deixasse ficar prisioneiro no castelo até que o viessem resgatar. A menina mais velha foi ter com o conde, e disse-lhe que casaria com ele, se lhe ensinasse qualquer coisa que ela não soubesse. O cativo disse:

— Pois ensino-te a minha religião, e vens comigo para o meu reino, e casaremos.

Ela não quis. Deu-se o mesmo com a segunda.

Veio por sua vez a menina mais moça; quis aprender a religião, e combinaram fugir do castelo, sem que o rei soubesse de nada. Disse então ela:
— Vai à cavalhariça, e hás de lá encontrar um rico cavalinho de sete cores, que corre como o pensamento. Espera por mim no pátio, à noite, e partiremos ambos.

Assim fez. A princesa apareceu com os seus vestidos de moura, com muitas joias, e à primeira palavra que disse logo o cavalinho das sete cores se pôs nas vizinhanças da cidade donde era natural o cativo conde.

Antes de chegar à cidade havia um grande areal; o conde apeou-se, e disse à princesa moura que esperasse ali por ele, enquanto ia ao seu palácio buscar fatos próprios para aparecer na corte, porque estava com roupas de cativo e ela de mourisca.

Assim que a princesa ouviu isto, rompeu em um grande choro:

— Por tudo quanto há não me deixes aqui, porque hás de te esquecer de mim.

— Como é que isso pode ser?

— Porque assim que te separares de mim e alguém te abraçar logo me esqueces completamente.

O conde prometeu que se não deixaria abraçar por ninguém, e partiu; mas assim que chegou ao palácio a sua ama de leite conheceu-o, e com a alegria foi para ele e abraçou-o pelas costas. Não foi preciso mais; nunca mais ele se pôde lembrar da princesa. Ela tinha ficado no areal, e foi dar a uma cabana onde vivia uma pobre mulher, que a recolheu e tratou bem; ali foi ter a notícia que o conde estava para casar com uma formosa princesa, e na véspera do casamento a mourinha pediu ao filho da velha que levasse o cavalinho das sete cores a passear no adro da igreja em que se haviam de casar.

Assim foi; quando chegou o noivo com o acompanhamento, ficou pasmado de ver um tão belo cavalinho, e quis mirá-lo de mais perto. O moço que o passeava andava a dizer:

Anda, cavalinho, anda,
Não esqueças o andar,
Como o conde esqueceu
A moura no areal.

O noivo lembrou-se logo da sorte que lhe tinha caído, desfez o casamento com a princesa e foi buscar a mourinha com quem casou, e viveram muito felizes.


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Ano de publicação: 1883
Origem: Portugal
(Algarve - Lagoa)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)

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