sábado, 25 de dezembro de 2021

João Pequenito (Conto Popular), de Adolfo Coelho

 

JOÃO PEQUENITO

Havia noutros tempos um homem que tinha três filhos e, como fossem muito pobres, disse-lhes um dia: “Meus filhos, é tempo de ir correr mundo em busca de fortuna, pois eu nada tenho que lhes deixar quando morrer.” Então os filhos despediram-se do pai e partiram para muito longe, indo ter à corte de um rei turco muito mau. Logo que lá chegaram, pediram agasalho por aquela noite; o rei mandou-os entrar no palácio e, como ele tinha três filhas, mandou que deitassem os três rapazes nas camas das filhas e que lhes pusessem na cabeça umas carapuças de prata, que era para quando eles estivessem a dormir lhes ir cortar a cabeça.

Lá pela noite adiante o rapaz mais novo, que se chamava João Pequenito (apelido que lhe puseram por ele ser muito baixinho), levantou-se e tirou a carapuça da cabeça e das cabeças dos irmãos; pô-las nas cabeças das filhas do rei e fugiu do palácio mais os irmãos, escapando assim à morte.

O rei turco, de noite, foi para matar os rapazes e matou as filhas.

Quando os rapazes já iam muito longe, disse o João Pequenito: “Agora é preciso separarmo-nos e cada qual busque a sua vida.” O João Pequenito foi ao palácio de certo rei e pediu para que o tomassem para criado. O rei nomeou-o seu jardineiro e ele de tal maneira se soube haver que o rei estimava-o mais que todos os outros criados. Entre estes começou a reinar muita inveja a ponto de irem dizer ao rei que o João Pequenito tinha dito que era capaz de ir furtar uma bolsa de moedas que o rei turco tinha debaixo da cabeceira. Chamou o rei o João Pequenito e disse-lhe o que os criados tinham dito e ele respondeu que sim, que iria, e disse mais: “Mande Vossa Majestade dar-me um navio para eu ir à corte do rei turco e verá de quanto eu sou capaz.”

Foi o João Pequenito; subiu pela parede do palácio do rei turco, entrou pela janela e quando o rei dormia tirou-lhe a bolsa de debaixo do travesseiro e fugiu.

O papagaio do rei turco começou a gritar:

— Ó rei, olha que o João Pequenito leva a tua bolsa de moedas. 

— Deve ser esta a voz do papagaio.

O rei foi ver à janela, mas ele já ia longe; o rei ainda lhe perguntou:

— Tornarás cá, Pequenito?

— Tornarei, tornarei — respondeu ele.

E foi todo contente levar a bolsa ao rei seu amo.

Passados dias, foram dizer ao rei que o João Pequenito dissera que era capaz de ir furtar a coberta de campainhas que o rei turco tinha na cama. De novo é o Pequenito interrogado e lá volta à corte do turco, furta a coberta e foge. O papagaio do rei turco gritava:

— Ó rei, Ó rei, olha o Pequenito, que leva a tua coberta de campainhas. O turco foi à janela e perguntou:

— Tornarás cá, Pequenito?

—  Tornarei, tornarei.

Chegou o Pequenito ao palácio do seu amo com a coberta e o rei cada vez estava mais agradado dele por ver a sua valentia.

De novo os criados foram dizer ao rei que o Pequenito dissera que era capaz de ir furtar o papagaio do rei turco. O Pequenito, logo que isto soube, aprontou-se e foi. Furtou o papagaio e este gritava pelo caminho:

— Aqui d'el-rei, que me levam furtado. E o Pequenito gritava:

— Aqui d'el-rei, que furtado me levam.

Chegado o Pequenito ao palácio, novos trabalhos o esperavam.

Disseram ao rei que o Pequenito dissera que era capaz de furtar o próprio rei turco e de o trazer para o palácio. Então o rei disse-lhe:

— Se tu fores capaz de me trazer aqui o rei turco, casarás com a princesa minha filha. O Pequenito respondeu:

— Dê-me Vossa Majestade um exército de homens e alguns navios e verá de quanto é capaz o Pequenito.

Aprontou-se tudo e o Pequenito arranjou uma grande caixa e foi ao palácio do turco e quando ele estava a dormir envolveu-o na roupa da cama; desceu com ele pela janela, meteu-o na caixa e à frente do exército lá o levou para a corte do rei seu amo. Este quis logo que o Pequenito casasse com a sua filha; fizeram-se grandes festas e o Pequenito mandou ir para o palácio o seu pai e irmãos, dando-lhes altos cargos na corte. E assim acaba esta história de que:

A certidão está em Tondela 
Quem quiser vá por ela.

---
Ano de publicação: 1879.
Origem: Portugal.
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)

Nenhum comentário:

Postar um comentário