quarta-feira, 8 de dezembro de 2021

Castigo de bem-falantes (Conto tradicional português), de Ana de Castro Osório

 

CASTIGO DE BEM-FALANTES
 

Três lorpas, muito vaidosos, não contentes com os disparates que faziam na sua aldeia, resolveram vir de companhia à Capital, porque, diziam eles, queriam aprender a falar à lisboeta.

Para aprenderem melhor separaram-se, seguindo cada qual por sua rua.

O primeiro ouviu dizer, a uns sujeitos bem vestidos, que conversavam à porta de uma tabacaria:

— Nós todos três...

O segundo parou defronte dum ourives, onde estavam umas senhoras vendo as joias e ouviu uma dizer:

— Por nosso gosto...

Vai o terceiro e encontra uma grande multidão aclamando um homem que se tornara notável, e ouviu dois espectadores que diziam:

— Justo será...

Ficaram com aquilo na cabeça e a todo o momento empregavam as palavras que tinham aprendido, para mostrarem que já sabiam falar à lisboeta. Daí voltaram todos três à terra, radiantes com a sua sabedoria.

No meio do caminho encontraram um homem morto e foram dar parte à justiça. Perguntou-lhes o Juiz:

— Quem o matou?

— Nós todos três (respondeu o primeiro).

— Por que motivo (continuou o Juiz)?

— Por nosso gosto (respondeu o segundo).

— Bem, então vão ser presos.

— Justo será (disse o terceiro). 

E assim foram metidos na prisão, por quererem falar à lisboeta.

É o que sucede a quem fala sem pensar, nem saber o valor das palavras.



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Origem: Portugal.
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)

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