quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

A princesa adivinha (Histórias da avozinha), de Figueiredo Pimentel

 

A PRINCESA ADIVINHA

Luísa era uma princesa, que tinha tudo quanto pode haver de mais formoso. Quem a via, ficava logo perdido de amores.

Pretendentes sem conta, todos os reis da terra, apareceram, pedindo-a em casamento. Luísa recusou-os, declarando que só se casaria com o homem, fosse quem fosse, capaz de fazer uma adivinhação que ela não conseguisse decifrar.

Sabendo disso, um rapaz, conhecido como Zé Tolinho, quis ver se obtinha aquele impossível. Filho de um viúvo que se casara em segundas núpcias, a madrasta maltratava-o. Era um desgraçado, e tanto lhe fazia viver como morrer.

Saiu de casa, em companhia de uma cachorra chamada Pita, levando um pedaço de pão, que a madrasta lhe dera.

Ia reparando em tudo quanto via pelo caminho.

Sentindo fome, estava para trincar o pão, quando se lembrou que a madrasta podia tê-lo envenenado.

Para experimentar deu-o à cadelinha, que caiu morta no mesmo instante.

Estava a enterrar o pobre animalzinho, e ia pô-lo no buraco que cavara, mas não teve tempo: uma nuvem de urubus desceu, e alguns, mais ousados, devoraram-na de pronto. Sete mais esfomeados, morreram.

Tolinho caminhou adiante, levando os urubus mortos.

Chegando a uma casa que havia à beira da estrada, três bandidos tomaram-lhe à força os urubus. Havia muitos dias que se achavam foragidos da polícia, e morriam de fome. Atiraram-se aos urubus, julgando que eram galinhas, e morreram envenenados.

Vendo-os mortos, Tolinho escolheu a melhor espingarda, e prosseguiu na jornada.

Um pouco mais longe avistou um macaco trepado sobre uma árvore. Apontou a espingarda, fez fogo, mas errou o tiro, indo porém matar uma pomba-rola que não vira. Depenou-a, assou-a, fazendo fogo com a madeira conhecida como santa-cruz, e comeu-a. Sentia sede, e não tendo água, aparou o suor que lhe escorria do rosto, e bebeu-o.

Terminado o frugal jantar, marchou pelo caminho em fora, encontrando um cavalo morto, levado pela correnteza do rio, enquanto os urubus o comiam.

Meia légua mais além, reparou que um burro escavava o chão, até encontrar uma panela com dinheiro, ali enterrada. Apanhou o dinheiro, montou no animal e chegou ao palácio.

Quando Luísa soube que um novo pretendente se apresentava, marcou a hora para a audiência.

No salão principal do régio paço, perante a corte, na presença dos maiores sábios, e mais ilustres literatos, Tolinho compareceu, e propôs o enigma:

Eu saí com massa e Pita:
A massa matou a Pita;
E Pita matou a sete,
Que também a três mataram.
Das três a melhor colhi,
E atirando no que vi,
Fui matar o que não vi...
Foi com a madeira santa,
Que cozinhei e comi;
Bebi água, não do céu;
Um morto vivos levava;
E o que os homens não sabiam,
Sabia um simples jumento...
Decifre, pra seu tormento...

Em vão Luísa tentou adivinhar o enigma.

Não o conseguindo, cumpriu a sua palavra, desposando Tolinho.

 

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Ano de publicação: 1896.
Origem: Brasil (Reconto)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)

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