terça-feira, 28 de dezembro de 2021

A gata mudada em mulher (Fábula), de Justiniano José da Rocha

 

A GATA MUDADA EM MULHER 

Um misantropo, no demais modelo de todas as virtudes, tinha pela sua gata um amor exclusivo; achava-a bonita, engraçada, mansinha, e por fim, o que no sexo dela é raríssimo, tão discreta quão fiel e agradecida. Ah! se uma mulher houvesse como esta gatinha, dizia, ou se dado me fosse transformar em mulher este mimo dos animais, então acharia uma companheira com quem atravessasse o mar tempestuoso da vida! Condoeu-se dele uma fada, e cedendo a seus votos, transformou a gata em moça. Confuso pelo milagre, o nosso homem deu-se por feliz em poder naquele dia mesmo ir aos pés dos altares dar a mão de esposo a essa bela mulher.

Gata-moça e misantropo estavam nas nuvens, e este repetia àquela mil lições e mil conselhos, que ela, multiplicando-lhe afagos e carinhos, ouvia atentíssima. Súbito, faz-lhe ela sinal que se cale, inclina a cabeça; é toda atenção; dá ligeira um pulo, e agarra em um ratinho que travesso saíra do seu buraco. O instinto havia falado: a mulher era gata.

MORAL DA HISTÓRIA: Por mais que procuremos vencer a nossa índole, sempre ela aí volta inesperada; fechai-lhe a porta, entra pela janela. 

 

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Ano de publicação: 1852.
Origem: Brasil  (imitadas de Esopo e La Fontaine)

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