De quando em quando, nos dias de missa ou de festejos religiosos, enquanto o povo estava aglomerado em torno da igreja, o aleijadinho aparecia, arrimado a uma muleta, e ia implorando esmolas com o chapeuzinho no ar.
Todos o conheciam e davam-lhe pequenas esmolas, uma moeda, um pedaço de pão, gulodices, a que ele com sua vozinha simpática agradecia, dizendo:
— Deus lhe pague.
O aleijadinho morava no meio de uma floresta numa velha choupana coberta de telhas de zinco com seu pai, que há muitos anos gemia no fundo do leito, entrevado pela enfermidade.
O filho era o seu único amparo; levava-lhe a comida à boca, dava-lhe água, os medicamentos que lhe aconselhavam para suavizar-lhe as dores; e quando o sustento escasseava, lá ia a pobre criança para a povoação, arrastando-se pelas estradas.
Pedia esmola aos passeantes e tudo que lhe davam guardava numa sacola.
Entrava pelas casas de famílias e desde a entrada ia gritando:
— O aleijadinho!
As crianças corriam a recebê-lo, davam-lhe roupas novas, doces, e muitas invejavam a sua existência humilde, a coragem que tinha de caminhar pela floresta em noites escuras, sem medo aos lobos nem às feras.
Perguntavam-lhe se havia almas do outro mundo na escuridão da mata; a tudo o pobrezinho respondia sorrindo, e contava histórias curiosas de passarinhos, das tempestades do inverno, e, inteligente como era, inventava novelas de fadas, castelos encantados, para iludir a miséria da sua vida.
Tirava dos bolsos ovos de passarinhos, ninhos, pedras de varias cores, distribuía tudo entre as crianças, contando histórias muito bonitas a respeito de cada objeto.
Ia-se embora apressadamente, para que a noite o não surpreendesse em caminho, e, quando entrava na choupana, começava a mostrar ao pai, muito alegre, as esmolas que havia recebido.
E assim ia vivendo a miserável criança, de sofrimento em sofrimento, ignorante dos gozos da fortuna, mas tão resignada sempre, que nunca se lhe viu uma lágrima nos olhos nem um gesto de revolta na candura do seu rostinho.
Passado algum tempo, como o pobrezinho não aparecia mais na aldeia, todos começaram a pensar que as feras decerto o tinham devorado e ao seu velho pai, em alguma noite escura, no silêncio da floresta.
Houve nos corações das crianças um enternecimento geral.
Todos o choraram, lhe lastimaram a sorte, e muitas mãozinhas se ergueram ao céu, suplicantes, rogando a Deus repouso para a sua alma.
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Ano de publicação: 1899
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2022)
Ano de publicação: 1899
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2022)
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