terça-feira, 23 de novembro de 2021

O carreiro e o papagaio (Fábula), de Monteiro Lobato

 

O CARREIRO E O PAPAGAIO

Vinha um carreiro à frente dos bois, cantarolando pela estrada sem fim. Estrada de lama.

Em certo ponto o carro atolou.

O pobre homem aguilhoa os bois, dá pancadas, grita; nada consegue e põe-se a lamentar a sorte.

— Desgraçado que sou! Que fazer agora, sozinho neste deserto? Se ao menos São Benedito tivesse dó de mim e me ajudasse...

Um papagaio escondido entre a ‘olhas condoeu-se dele e, imitando a voz de santo, começou a falar:

— Os céus te ouviram, amigo, e Benedito em pessoa aqui está para o ajutório que pedes.

O carreiro, num assombro, exclama:

— Obrigado, meu santo! Mas onde estás que não te vejo?

— Ao teu lado. Não me vês porque sou invisível. Mas, vamos, faze o que mando. Toma da enxada e cava aqui. Isso. Agora a mesma coisa do outro lado. Isso. Agora vais cortar uns ramos e estivar o sulco aberto. Isso. Agora vais aguilhoar os bois.

O carreiro fez tudo como o papagaio mandou e com grande alegria viu desatolar-se o carro.

— Obrigado, meu santo! — exclamou ele de mãos postas. Nunca me hei de esquecer do grande socorro prestado, pois que sem ele eu ficaria aqui toda a vida.

O papagaio achou muita graça na ingenuidade do homem e papagueou, como despedida, um velho rifão popular:

Ajuda-te, que o céu te ajudará.

 

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Ano de publicação: 1921.
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)

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